O COMPUTADOR
MENTAL
Sem medo se ser
tachado de "extremista darwiniano", Steven
Pinker, pesquisador do MIT, elabora uma teoria para
explicar como funciona a mente humana e chega a uma
conclusão simples e direta: igual a como trabalham os
computadores, elaborando e processando dados.
Hernán Valdés
Séculos de tradições e convicções profundamente
arraigadas nas pessoas, são sacudidas com as páginas de
"Como a mente funciona", a última obra do
cientista norteamericano Steven Pinker. O livro vem
despertando reações díspares: desde os maiores elogios
até as críticas mais duras.
Pinker, professor de Psicologia e diretor do Centro de
Neurociência Cognitiva no Instituto Tecnológico de
Massachussetts, entrega-se à difícil tarefa de definir como
a mente trabalha, e como ela faz as pessoas se comportarem de
uma ou outra maneira.
Já nos primeiros capítulos acende a polêmica quando
equipara o cérebro humano a um computador, ao explicar como
se produzem no córtex os processos da visão, da audição e
do movimento. Mas a polêmica aumenta à medida que avança a
leitura, quando o autor demonstra que expressões tais como a
fé, a organização política e, inclusive, o comportamento
sexual, têm a ver unicamente com a forma pela qual a mente
trata de manter a sobrevivência do homem como espécie e
como indivíduo, depois de um processo natural de evolução
ao longo de milhares de anos.
Na sua obra anterior "O instinto da linguagem",
Pinker afirmou que a mente está naturalmente programada para
a aprendizagem e para produzir uma linguagem. Agora em seu
novo livro, apresenta-a como um sistema organizado, composto
por "órgãos mentais", isto é, estruturas neurais
projetadas para resolver os problemas que os primeiros homens
enfrentavam em seu difícil estilo de vida, tais como
entender e manipular objetos, animais, plantas e outros seres
humanos.
Embora no texto o tema seja tratado sob a perspectiva de
duas teorias, a seleção natural darwiniana e a
computacional ou processamento da informação, Pinker se
vale principalmente desta última para explicar os processos
mentais. Assim, o especialista se serve de décadas de
pesquisa científica e constrói uma "teoria
computacional da mente", imaginando que o cérebro
humano se comporta de um modo similar a como fazem os PCs.
Assim, existiriam "módulos" ou "agentes
cerebrais" compostos por milhares de neurônios
maciçamente interconectados trabalhando em padrões
sequenciados, igual a como os chips se estruturam na CPU
(Unidade de Processamento Central) de um computador.
Ditos agentes devem levar a cabo tarefas complicadas, tão
diversas como detectar as bordas de uma figura que está
sendo vista, situar-se e avaliar a situação e expressar
sentimentos de tristeza. Enfim: pode-se abarcar toda uma
faixa de atividades incluindo as sensações e
emoções das quais o cérebro é o único encarregado
de controlar. Por isso, Pinker denomina o cérebro como
"o órgão mental" e o considera um verdadeiro
"computador orgânico".
As teorias de Pinker desataram uma forte polêmica no
âmbito acadêmico, já que não é fácil aceitar que a
mente nada mais é que o produto elaborado pelos neurônios
em sua contínua análise de dados.
Mas o pesquisador do MIT se defende argumentando que o que
torna o cérebro e os computadores entes inteligentes é que
os dois fazem praticamente o mesmo: ambos realizam
abstrações da realidade. "É como explicar a razão
pela qual voam tanto os pássaros quanto os aviões: ambos
obedecem às leis da aerodinâmica. Entretanto, isso não
significa que os aviões e os pássaros sejam a mesma
coisa", explica.
Com um tom marcadamente racionalista, Pinker pode ser tido
como uma fraude para aqueles que baseiam a maior parte dos
seus atos na fé e permitem ser guiados por forças
sobrenaturais, sejam elas deuses, anjos ou superstições. O
psicólogo afirma que tudo isso não é outra coisa além do
produto da nossa própria mente adaptando-se às
circunstâncias que precisa enfrentar, mas que não existem
fora dela. "Num sistema tecnológico bem projetado, os
componentes são caixas pretas que realizam suas funções
como se o fizessem por arte mágica. Isto não é menos
verdadeiro em relação à mente. Parece-nos que a faculdade
de refletir sobre o mundo não tem igual em outras faculdades
para as quais está dotada. Isso nos faz vítimas de uma
ilusão: que a nossa própria psicologia provém de alguma
força divina, uma essência misteriosa ou um princípio
todo-poderoso", diz o autor, e acrescenta: "Na
mente não existe nada mais exceto atividade neural".
Por isso, a "teoria computacional da mente"
torna-se uma explicação muito fácil e compreensível,
embora seja uma dura prova para muitos. Pinker raciocina que
"sem uma teoria computacional, é impossível dar
sentido à evolução do cérebro, já que ela nos permite
situar a mente em um mundo natural. Se podemos dizer que os
estados cerebrais são estados computacionais, podemos manter
uma explicação em um universo materialista visível, sem
perder a riqueza da psicologia humana".
Os últimos capítulos do livro são os que despertam
controvérsia. Pinker sustenta que tudo aquilo que, em
teoria, define os seres humanos como tais, incluindo as que
são consideradas as mais elevadas faculdades do cérebro
(tais como a arte, a filosofia, a linguagem, a religião, ou
expressar emoções como amar ou odiar), nada mais são que o
fruto de milhões de anos de evolução e condicionamento.
Quando aborda o tema da fé, nas últimas páginas de
"Como a mente funciona" é quando desperta as iras
de seus críticos. Por um lado, postula que as religiões
foram criadas com o fim de manter organizado um grupo de
mentes humanas que são capazes de ver o mundo de acordo com
suas próprias interpretações, o que o leva a assinalar que
toda a religião é "simplesmente, uma ferramenta útil
de controle social. Se as crianças acreditam que seus pais
estarão observando-as de outra vida ultra-terrena, é mais
provável que sejam mais respeitosas com alguém enquanto
dure esta vida terrena".
Mas o autor também se permite explicar porque as pessoas
acreditam na existência de forças divinas que as guiam.
Segundo Pinker, isso tem a ver com a necessidade da nossa
mente encontrar alguma forma que lhe permita
"evidenciar" as contradições e dificuldades que o
mundo lhe apresenta. Isto significa que se existem seres com
psicologia intuitiva, habilidade para analisar o
comportamento de outras pessoas e a capacidade de influir na
mente de outros, tende-se a pensar que as mentes que fazem
tais coisas não necessitam corpos para neles viver. Essa
classe de mentes que não requerem um corpo material, são
denominadas almas, fantasmas, deuses, demônios ou gênios. A
religião, então, é possível porque uma psicologia
intuitiva pode imaginar as mentes como entidades autônomas
que mobilizam os mais profundos anelos humanos: êxito no
amor, ganhar no campo de batalha e nunca sofrer fome ou
enfermidades.
Para Pinker, se há algum mistério que nossa mente não
pode compreender, é simplesmente porque o cérebro não é
suficientemente bom e a evolução levou-o tão longe quanto
foi possível, mas não mais além. Ou seja: o computador
orgânico estaria obsoleto e haverá que esperar que o tempo
faça o "upgrade" (atualização)
que se precisa.
Como a
mente funcionaFicha Técnica:
ISBN 8571648468
BROCHURA
1ª Edição 1998,
666 pág.
Steven Pinker
Editora Cia. das Letras
R$ 38,50
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O copyright de "El
Computador Mental" pertence a Hernán
Valdés.
Este artigo foi publicado originalmente em
Espanhol na Revista QuePasa 1397
20 al 26 de enero de 1998, no endereço eletrônico:
http://www.quepasa.cl/revista/1397/12.html |
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