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Paranormal e Pseudociência em exame
 


Um poltergeist em Ipanema

                                         Jorge A. B. Soares

Sob o título “Abraçado a este mundo”, Ruy Castro publica em sua coluna do dia 31/05/2017 na Folha de São Paulo o seguinte relato:

RIO DE JANEIRO - Um apartamento em Ipanema, deixado vago pela morte, há cinco anos, de seu ilustre proprietário, foi esvaziado pelos herdeiros e entrou em obras para ser alugado. Dali a pouco, os operários que foram trabalhar nele começaram a perceber coisas inexplicáveis. Um martelo colocado em um lugar reaparecia em outro. Os vasos davam descarga por conta própria. As lâmpadas piscavam seguindo um padrão. Os rapazes, apavorados, foram falar com o porteiro —nenhum deles queria ficar lá sozinho.

O porteiro subiu para conferir. Não viu nada de anormal. Mas ouviu —ou pensa ter ouvido— uma tosse, um suspiro, um pigarro, todos lembrando os ruídos produzidos pelo falecido. Ele próprio sentiu sopros gelados vindos das paredes. Mas tinha de tranquilizar o pessoal. Garantiu que não havia nada demais, que eles estavam imaginando. Os operários, a custo, continuaram a reforma —às vezes, um se demitia, de cabelo em pé. O próprio porteiro deixou de ir ao apartamento vazio à noite.

A obra ficou pronta e o imóvel foi alugado. O inquilino, um estrangeiro racional e pragmático, sabia da importância do antigo titular. Foi morar lá, sem desconfiar de nada, e, por muito tempo, não teve do que se queixar. Mas, há pouco, as estranhezas recomeçaram. Torneiras abriam. Livros mudavam de lugar. Um quadro amanheceu de cabeça para baixo. E a trilha sonora retomou os pigarros, tosses e suspiros. O inquilino ficou aterrorizado. Já deve ter se mudado.

Fui amigo do velho morador por quase 50 anos e sei que ele nunca acreditou no outro mundo. Talvez por isto tenha se dedicado a entender e nos desvendar —categoricamente— o nosso.

É a única explicação. Ao acordar de um estranho sono e descobrir-se morto, não se conformou e se recusa a trocar este mundo por outro que, como ele sempre soube, não existe. 

 

Muito interessante este caso relatado por Ruy Castro, por diversas razões. Trata-se de fenômenos inusitados desenrolando-se no ambiente cosmopolita, descolado e fervilhante de Ipanema, Rio de Janeiro, e o narrador é um jornalista, biógrafo e escritor ilustre, de altíssima credibilidade, acima de qualquer suspeita, que não tinha nada a ganhar e só a perder ao publicar esse texto.

E então, vamos embarcar nessa história, aceitando fatos “incríveis, fantásticos, extraordinários”1 ao pé da letra sem um mínimo de crítica racional?

Esse relato é um caso clássico de poltergeist2:  1) lâmpadas piscando seguindo um padrão, 2) objetos mudando de lugar ou de posição, 3) descarga de vasos sanitários e torneiras abrindo sem ninguém acionando, 4) tosse, suspiros, pigarros sem ninguém por perto, 5) sopros gelados vindos das paredes...

Décadas atrás, casos de poltergeist apareciam de vez em quando em jornais ou revistas, ocorrendo geralmente em pequenas cidades do interior e associados a um local onde vivia um adolescente – mais frequentemente uma menina. Quando investigados com perícia, revelaram que os fenômenos extraordinários eram geralmente produzidos por um adolescente com trauma psicológico buscando desesperadamente chamar atenção para si.

Um desses casos de poltergeist foi desvendado na televisão pelo Padre Quevedo no Fantástico, no quadro “Caçador de Enigmas“. Câmaras secretas instaladas pela equipe de produção da Globo, mostraram que uma menina provocava os fenômenos sorrateiramente quando não havia ninguém por perto. Isso foi em 2007. Daí para cá, à medida que as câmeras fotográficas digitais e depois os celulares com câmera inundaram o planeta, tornando fácil flagrar alguém tentando dar trote ou enganar os outros,  os casos de poltergeist sumiram das manchetes dos jornais.

A extrema raridade atual do caso relatado por Ruy Castro sugere não tratar-se de um fenômeno sobrenatural genuíno, como ele acredita, ao afirmar que essa "é a única explicação". Se poltergeists existissem, de verdade, seriam fatos relativamente comuns e constantes em todas as épocas e todos os lugares. Sua raridade atual sugere, ao contrário, tratar-se de fraude ou várias coincidências de fenômenos naturais ocorrendo em cascata.

Não aceitando o paradigma sobrenatural para o poltergeist do Ruy Castro, que hipóteses poderiam explicar o fenômeno?

A série de ocorrências citadas por Ruy Castro poderia ter-se originado por uma rara curiosidade – lâmpadas piscando em sequência, um objeto que parece ter mudado de lugar – seguida por outras raras coincidências estranhas que vão formando um quadro de suspense e pânico que culmina com a certeza de se estar vivenciando um fenômeno sobrenatural. Fantasmas não são reais, mas sim criações de mentes assombradas, que acreditam na existência dessas entidades sobrenaturais. Os fatos originais da série também poderiam ser produzidos por alguém que adora dar trotes, ou um desequilibrado em ação. Uma vez disparado, o processo se auto-alimenta virando uma série de quadros de um filme de terror. Uma vez instalado o fenômeno vai sedimentando, passa de boca em boca, de uma geração para outra, virando um elo permanente das “Lendas Urbanas”.

Qualquer fenômeno “incrível – fantástico – extraordinádio” não pode ser comprado pelo valor de face, é preciso formular hipóteses alternativas e estudá-las em profundidade com as ferramentas científicas disponíveis. E, se não houver nenhuma hipótese crível, melhor encerrar o caso declarando “não há explicação científica para este caso, no momento” do que abraçar a tentadora hipótese sobrenatural, pois até hoje que se saiba não há nenhum indício ou prova de que exista um “Além” ou “Plano Sobrenatural” onde atuam os espíritos dos mortos. E, cá para nós, é também muito estranho descobrir  que os mortos não têm nada de interessante para fazer a não ser sair por aí abrindo torneiras, acendendo luzes... Peraí... E tosse, pigarro? O espírito perdeu o corpo físico mas ainda tosse, pigarreia? Como isso é possível?

 

 1  "Incrível, Fantástico, Extraordinário" era um programa de rádio apresentado nos anos de 1940 e 1950 pelo radialista Almirante (Henrique Foréis Domingues). O programa semanal, na Rádio Tupi do Rio de Janeiro, contava histórias fantásticas de terror e mistério enviadas pelos ouvintes.

2 Poltergeist, do idioma alemão, é traduzido como fantasma barulhento (poltern = barulhento; geist = fantasma ou espírito). São conhecidos como Poltergeist os fenômenos sobrenaturais não explicados pela ciência. Lançamento de pedras, luzes que surgem do nada, deslocamento de objetos leves ou pesados, surgimento espontâneo de água, fogo, ou focos de luz, anormalidade nas instalações elétricas e telefônicas, abertura de portas, pancadas em lugares diversos, clarão ofuscante, estouro de lâmpadas, ruídos de passos ou correria, vozes, música, brinquedos que funcionam mesmo sem as baterias ou pilhas, correntes de ar, entre outros.


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