O que é Paranormal
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Paranormal e Pseudociência em exame
 


Onde estão as criaturas?

                                                                     Valdir Gomes (*)

Histórias fantásticas, envoltas em roupagem científica, não são tão difíceis de ocupar espaços importantes na mídia, que muitas vezes poderiam ser usados para informar e até instruir os leitores. Alguém se lembra de toda a paranóia e até da comédia que foram as histórias do "ET de Varginha" e do "chupacabras"? Por que os jornais, as tevês e revistas se esqueceram destes personagens? Quase nenhum veículo jornalístico se prontificou a resgatar as pistas sobre estas histórias, com exceção das revistas e jornais ufológicos, como não poderia deixar de ser, já que foi em suas páginas que tudo começou. A resposta pode estar na nossa cara!

A crítica aqui é a esse tipo de jornalismo sem memória que se está praticando, um jornalismo descartável, cuja falta de continuidade e de especialização deixa os leitores com informações truncadas e inúteis à construção do conhecimento. Está demorando a aparecer uma outra aventura pseudocientífica para a mídia correr atrás. Vez por outra, surgem novos boatos que desencadeiam uma avalanche de reportagens, na maioria das vezes sem qualquer consistência, e que, em vez de informar o leitor e trazer uma explicação mais plausível, contribuem para a manutenção de uma visão de mundo fantasiosa. Em todos esses casos – e em muitos outros - , a aparente falta de coerência e consistência das informações por parte das empresas de comunicação fez com que essas histórias perdessem a força junto aos leitores e, conseqüentemente, nos noticiários. Mesmo assim, alguns veículos ainda insistem em continuar abrindo espaço para assuntos dessa natureza, porque vendem bem. No caso do "ET de Varginha", nada ficou provado, após uma enxurrada de reportagens em revistas, jornais e programas de tevê conceituados. Com relação ao "chupacabras", a história perdeu a "graça editorial" depois que especialistas da Unicamp descobriram que a fera assassina era apenas um faminto cachorro-do-mato. Alguém ouviu alguma coisa sobre o animal depois que os jornais se "esqueceram" dele? Até que enfim as pobres cabras puderam dormir em paz!

Antes mesmo da imprensa ouvir os especialistas e autoridades científicas sobre os fenômenos que não encontram explicação no senso comum, os boatos se espalham e penetram o imaginário popular. Grande parte dessas fantasias deve-se à influência da mídia, que explora os assuntos de grande apelo na opinião pública, sem oferecer uma visão crítica e um embasamento científico e sem se questionar sobre a importância do que é informar com responsabilidade e com critérios científicos. Em função disso, as pseudociências terminam sendo o guia informativo para o leitor e em muitos casos, como aconteceu com o "ET de Varginha", os próprios jornalistas acabam se restringindo a investigar apenas fontes de informação duvidosas, contribuindo ainda mais para a distorção dos fatos. Neste momento, o jornalismo científico poderia entrar em cena, não fosse a escassez de repórteres especializados e de editorias de ciência e tecnologia nos jornais do interior e regionais.

A falta de jornalistas especializados divulgando as novidades e descobertas nas áreas de ciência e tecnologia, bem como buscando embasamento para lançar mais luz sobre os fenômenos misteriosos e "alternativos", dificulta o esclarecimento de aspectos importantes, muitas vezes vitais para a sociedade. A ciência está nitidamente carente de espaço para divulgação na mídia, sobre as pesquisas que vêm sendo realizadas em diversas áreas do conhecimento e sobre os benefícios que essas descobertas poderão trazer para a população. Mais do que informar sobre ciência, este espaço deveria funcionar como um momento também de reflexão sobre o impacto desta na sociedade. Para a ciência se tornar interessante para o leitor, como o são as matérias "alternativas", deve haver uma relação da sua aplicação prática com uma reflexão sobre seus resultados. A idéia é conjugar a divulgação da ciência utilitária, trazendo melhorias para a qualidade de vida, com a ciência de reflexão, como forma também de se produzir conhecimentos.

Em conseqüência dessa escassez de profissionais e de espaço, como os meios de comunicação são canais de propagação fácil de pseudociências, uma grande quantidade destas acaba ocupando as lacunas (que não deveriam existir), tomando tempo e espaço até maiores que os destinados à divulgação científica. Esta é uma situação que vem preocupando a comunidade científica e os raros redatores especializados em ciência e tecnologia. Além do mais, poucos jornais possuem um caderno ou uma seção fixa para divulgação científica. Já as áreas destinadas à astrologia, esoterismo e misticismos, de todas as formas, são mantidas fielmente e crescem a cada dia. Não que elas não devessem existir, mas é questão de se manter um equilíbrio, demonstrando respeito aos leitores. Que se mostre temas alternativos, mas que se mostre também a face da ciência, como contrapartida da democratização da informação, permitindo, assim, que os leitores construam seu próprio conhecimento.

Apesar do esforço de alguns cientistas, atuando como eficientes divulgadores, o papel do jornalista científico é insubstituível. A sua tarefa não é nada simples e talvez seja por isso que haja tão poucos iniciados no gênero: cabe a ele a função de mediador e intérprete dos processos e métodos da ciência, sua política e seus resultados; funciona como uma ponte entre a linguagem hermética e altamente técnica do meio científico e a linguagem simples e prática do cidadão comum; transforma fórmulas matemáticas em texto inteligível, como um verdadeiro tradutor; decodifica idéias complexas em explicações e exemplos que vão ao encontro da praticidade do dia-a-dia; trabalhando lado a lado com a comunidade científica, tem a responsabilidade de repassar uma visão crítica e analítica dos avanços e descobertas do mundo científico e tecnológico.

Pela sua proximidade com a sociedade e ao partir do senso comum, o jornalismo científico torna-se a forma de divulgação da ciência de uma maneira acessível a pessoas que a consideram de difícil compreensão. Se os veículos jornalísticos tivessem em suas redações profissionais especializados na área científica, provavelmente os meios de comunicação ainda estariam repletos dessas criaturas, como o "ET de Varginha" e o "chupacabras", além dos duendes, das fadas, das pedras mágicas, entre outros, mas convivendo lado a lado com a versão científica, que deixaria para o leitor/espectador a missão de decidir conscientemente entre a fantasia e a realidade da informação. Enquanto isso, esperamos a chegada de mais uma criatura estranha, vinda não se sabe de que canto do planeta, para invadir os noticiários e depois fugir por entre a mata do sensacionalismo.

(*) Jornalista, mestrando em Comunicação Social na
Universidade Metodista de São Paulo – Umesp.

Copyright Correio Popular
, 8/4/98.

Este artigo foi originalmente publicado no Observatório da Imprensa
http://www.observatoriodaimprensa.com.br/ofjor/ofc051098b.htm

 


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