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MITOS DO ALÉM, EXPLICADOS PELA CIÊNCIA
VEJA on-line Edição 1994
7 de fevereiro de 2007
Um
tipo de experiência alimenta, em especial, mitos e interpretações místicas em
todas as culturas – o da quase-morte. São relatos feitos por pessoas dadas como
mortas mas que, de modo espontâneo ou com a ajuda da medicina, voltaram à vida.
Muitas se referem a túneis de luz ou à sensação de flutuar no ar, de modo a ver
do alto o próprio corpo. Nos últimos anos, pesquisas médicas, principalmente as
realizadas com tecnologia de imagem da atividade cerebral e eletroencefalogramas,
puderam explicar de forma científica boa parte desses fenômenos.
Flutuar fora do corpo
Enquanto fazia exames numa paciente epilética, o neurologista suíço Olaf Blanke,
do Hospital Universitário de Genebra, descobriu que a estimulação de determinada
área do cérebro provocava na paciente a sensação de abandonar o próprio corpo e
flutuar pela sala. O ponto em questão é o giro angular direito, parte do cérebro
localizada no lobo parietal. Essa região é responsável pela percepção espacial
que se tem do próprio corpo e do ambiente em torno. Ao estimular o giro angular
com pequenas descargas elétricas, Blanke afetou a forma como o cérebro da
paciente decodificava a percepção do espaço e dela própria, quebrando a unidade
que existe entre o eu e o corpo. Dessa maneira, a paciente se sentia como se
estivesse a flutuar no teto, enquanto seu corpo permanecia na cama.
Sentir a presença de espíritos
Os médicos já sabem que isso é causado pela falta de oxigenação do cérebro. Ao
estimular com eletrodos o giro angular esquerdo de uma paciente, o médico Olaf
Blanke percebeu que ela virava a cabeça como se procurasse alguém dentro da
sala. "Quando se desligava a corrente elétrica, a presença estranha sumia",
disse Blanke a VEJA. Para o neurologista, o estímulo no giro angular esquerdo
criou uma disfunção no circuito neural que levou a paciente à ilusão de uma
projeção "torta" do próprio corpo, que ela interpretou como um fantasma.
Uma luz no fim do túnel
Depois de ser ressuscitado, o doente conta ter visto um túnel com uma intensa
luz na outra ponta. A neurocientista Susan Blackmore, da Universidade do Oeste
da Inglaterra, em Bristol, atribui o relato à ilusão provocada pela falta de
oxigênio no cérebro, típica de uma parada cardíaca. As células do córtex visual
responsáveis pela visão central são mais numerosas que as da visão periférica e,
por isso, vêem a imagem com maior brilho. Para a cientista, essa diferença de
luminosidade causa a impressão de existir um túnel com luz intensa no seu final.
"É algo puramente biológico que as pessoas tendem a ver como místico", disse
Susan a VEJA. "Drogas como LSD, quetamina e mescalina podem produzir o mesmo
efeito em algumas pessoas."
Corpo paralisado ao despertar
Quando o corpo atinge um estado de sono profundo, ocorre uma mudança química nas
regiões do cérebro responsáveis pela atividade muscular. O objetivo é paralisar
os músculos para evitar que os movimentos dos sonhos sejam reproduzidos na vida
real. Algumas pessoas acabam despertando durante esse período, com os músculos
ainda paralisados. "A sensação é desesperadora e a pessoa sente dificuldade para
respirar. Não é incomum ela associar esse evento a experiências espirituais,
místicas, demoníacas e até mesmo a encontros com aliens", explica a
neurocientista Susan Blackmore.
Toda a sua vida passou diante dos
olhos
Muita gente acredita que no momento da morte se vê uma espécie de retrospectiva
da própria vida. Para os cientistas, essa retrospectiva é uma alucinação causada
pelo cérebro, assim como o encontro com entes queridos já falecidos ou figuras
religiosas. Ocorre que, nos momentos finais, regiões do cérebro se tornam
hiperativas numa última tentativa de compensar a falta de oxigênio, cujo
abastecimento diminui à medida que as batidas do coração se tornam irregulares.
"O cérebro então libera substâncias para proteger os neurônios, desligando-os",
diz Renato Sabbatini, professor da Universidade Estadual de Campinas. Algumas
dessas substâncias agem diretamente nos receptores dos neurônios, causando o que
os médicos chamam de dissociação neural. "É isso que provoca alucinações", diz
Sabbatini.
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